Dos escritos de Agostinho

DEUS É A VIDA DE TUA ALMA

“Tua alma morre perdendo a sua vida. Tua alma é a vida do teu corpo, e Deus é a vida de tua alma. Do mesmo modo que o corpo morre quando perde a sua alma, que é sua vida, assim a alma morre quando perde a Deus, que é sua vida. Certamente, a alma é imortal, e de tal modo é imortal, que vive mesmo estando morta. Aquilo que disse o Apóstolo da viúva que vivia em deleites pode-se dizer também da alma que tem perdido o seu Deus: que vivendo está morta”.

(Com. Ev. de João, 47, 8)

20 lições para conhecer a Santo Agostinho

 

11.- MARTELO DOS HEREGES ATÉ O FIM

(Idade: 76 anos)

Um dos títulos que recebia Agostinho era o de “Martelo dos hereges”, devido a sua luta contra os mesmos. Maniqueus, donatistas e pelagianos formaram o triângulo das heresias mais notáveis de luta agostiniana. Nenhuma delas existe na atualidade, mas em tempos de Santo Agostinho estavam em pleno vigor. Não se pode separar a luta contra as heresias do apostolado do bispo de Hipona, porque delas saíram várias de suas obras mais importantes. Um exemplo é o tratado sobre a graça divina, escrito contra os pelagianos.

Já foi feita uma breve alusão aos donatistas e maniqueus (lições 1 e 4). Quanto ao pelagianismo, trata-se da doutrina de um monge irlandês chamado Pelágio. Desembarcou na África em 411. Sua morte deu-se, provavelmente, em 418, no Oriente. Pelágio negava o pecado original. Não admitia o batismo de crianças. Afirmava que o homem é capaz de salvar-se por suas próprias forças, sem necessidade da graça divina. Mais tarde suas doutrinas se estenderam por toda a parte. Santo Agostinho combaterá vigorosamente os partidários de Pelágio.

A fama de Agostinho não tinha limites. De todas as partes acorriam a ele em busca de soluções às dificuldades que aumentavam sem cessar. Suas obras são conhecidas em toda a Igreja. São lidas, tanto na Espanha quanto no Oriente, na Itália ou na Gália. E, quando está quase na hora de se reunir o Concílio de Éfeso, lhe é dirigido um convite especial para tomar parte nesta assembleia. Mas o convite chegará a Hipona depois da morte de Agostinho. Este convite constitui um eloquente testemunho da reputação a que chegou Santo Agostinho e que se deve unicamente ao zelo que não deixou de mostrar em favor da verdade católica.

É lastimável que Santo Agostinho não tenha podido participar do Concílio de Éfeso (431). Sua contribuição teria sido extraordinária. Especialmente em relação a doutrina sobre a Virgem Maria que, nesse Concílio foi proclamada “Mãe de Deus”.

INVASÃO DA ÁFRICA

Dia 24 de agosto de 410, no meio de uma enorme tormenta, os godos, sob o comando de Alarico, entram em Roma e tocam fogo na cidade. O saque da capital durou três dias e três noites. As crônicas nos falam de uma destruição completa: incêndios, assassinatos em massa, torturas e mutilações. Mas, o que os godos procuravam era, sobretudo, o ouro; e, ao partir, levaram os carros repletos de um valorosíssimo confisco.

Não é fácil, depois de quinze séculos estimar as perdas materiais. Sem dúvida que os historiadores exageraram, devido ao sentimento de patriotismo, ao se referir a esse evento. O certo é que a invasão de Roma deve ter causado uma marca profunda nos habitantes das províncias. A triste notícia provocou um eco de comoção e espanto.

Os pagãos quiseram acusar à Igreja Católica como responsável pela ruína de Roma. Estes fatos históricos deram a Agostinho motivos para escrever uma das suas obras mais importantes: “A Cidade de Deus”.

A invasão da África nos é contada por Possídio de Calama, testemunha ocular dos acontecimentos:

Algum tempo depois, dispôs a Divina Providência que numerosas tropas de bárbaros cruéis, vândalos e alanos, misturados com godos e outros povos vindos da Espanha com todo tipo de armas e preparados para a guerra, desembarcassem e irrompessem na África. Após atravessar todas as regiões da Mauritânia, penetraram em nossas províncias, deixando em toda parte rastros de sua crueldade e barbaridade, assolando tudo com incêndios, despojos e outros inumeráveis e horríveis males. Não tinham nenhuma distinção entre sexo e idade. Não perdoavam os sacerdotes nem os ministros de Deus, nem respeitavam os ornamentos sagrados, nem os edifícios dedicados ao culto divino” (Vida de Santo Agostinho, c. 28)

A cidade de Hipona estava solidamente fortificada e preparada para uma longa resistência aos invasores. Por este motivo, se converteu em refúgio aos habitantes dos arredores. Muitos bispos estavam entre os refugiados.

O assédio à cidade começou no final de maio do ano 430. Agostinho, também chamado “Águia de Hipona”, já tinha entrado nos seus 76 anos de idade. Embora com as forças diminuídas, não mudou em nada seu regime de vida: orava, escrevei, anunciava o Evangelho, acolhia aos fieis, preparava-se, enfim, para o encontro definitivo com Cristo.

Catorze meses durou o assédio completo, porque bloquearam a cidade totalmente até pela parte do litoral. Lá eu me refugiei com outros bispos e lá permanecemos durante o tempo do assédio. O tema ordinário de nossas conversas era a terrível ameaça dos bárbaros, deixando nas mãos de Deus nossos destinos e dizíamos: ‘Justo sois Senhor, e retos teus juízos’. E misturando nossas lágrimas, gemidos e lamentos orávamos, unidos ao Pai de toda misericórdia, para que dignasse fortalecer-nos em tão tremenda prova” (Possídio, Vida de Santo Agostinho, cap. 28)

Um dia, conversando à noite, Agostinho nos disse: - Haveis de saber que eu, neste tempo de angústias, peço a Deus ou que livre a cidade de cerco dos inimigos ou, se é outro seu beneplácito, fortifique seus servos para cumprir sua vontade, ou me arrebate deste mundo para levar-me consigo. Dizia isto para nossa instrução e edificação. Depois, todos nós levamos à Deus as nossas súplicas’” (Possídio, Vida de Santo Agostinho, cap. 29)

Deus se dignou escutar as súplicas do seu servo. Antes que terminasse o terceiro mês de assédio, caiu enfermo. Quando sentiu a elevada febre de sua enfermidade, deu-se conta que seus dias estavam contados. Já fazia algum tempo que sua saúde deixava a desejar. Todos sabiam disto e se preocupavam. O conde Dario demonstrou-lhe sua simpatia, enviando-lhe alguns remédios que seu médico lhe havia recomendado. Outros, sem dúvida, fizeram o mesmo. Mas, Agostinho era ancião, e, com o peso da idade, as emoções, as angústias, as privações, já lhe era impossível ter qualquer tipo de ilusão e alimentar esperanças humanas.

Por outro lado, que importância teria para Santo Agostinho a vida aqui neste mundo? Desde o momento de sua conversão desejava conhecer e amar cada vez mais a Deus. Buscava contemplá-lo, possuí-lo sem limites. Não cessou de buscar o rosto de Deus. Agora, com alegria, sentia ter chegado o momento de dizer adeus às coisas deste mundo. E pôde fazê-lo com a consciência e o coração tranquilos e cheios de alegria.

Nos últimos dias de sua vida, Agostinho revisava todo o seu passado: Patrício, que havia morrido o primeiro da família; Mônica, que havia tido a alegria de ver convertidos, primeiro seu esposo, depois, o próprio Agostinho; seus irmãos que haviam descansado na paz do Senhor.

Depois repassava, em sua memória: a adolescência irrequieta, tempo de seus grandes pecados, mas também de grandes graças; a mulher com quem havia vivido durante tanto tempo; seu filho Adeodato; os amigos, Alípio e Nebrídio, que lhe rodearam sempre. Este último havia morrido na flor da juventude. Alípio ainda vivia e Agostinho não cessava de agradecer a Deus por haver-lhe conservado junto de si nos últimos momentos.

Vinham a seguir as horas decisivas de sua conversão. Simpliciano e Ambrósio tinham sido para ele, naquelas horas, os mensageiros da graça divina. Ele agora os ia encontrar na luz de Deus e com eles voltaria a cantar, sem interrupção, o eterno louvor de Deus.

No leito onde estava deitado, tinha um pouco de descanso e tempo livre para pensar em Deus, para meditar e orar. Tinha pedido a seus amigos e aos que lhe atendiam que o deixassem só, menos na hora em que o médico vinha vê-lo ou quando tinham que medicar-lhe com os remédios ou os alimentos. Embora fosse muito dura esta ordem do doente, todos a cumpriam, já que sabiam que Agostinho desejava dedicar os últimos momentos ao Criador.

Também havia manifestado desejos de que lhe copiassem os salmos penitenciais em caracteres grandes para que pudesse lê-los do leito. Assim se fez e as paredes apareceram adornadas com uma cópia dos salmos.

Agostinho era pobre. Desde sua chegada a Hipona havia feito a renuncia de todos os seus bens. Viveu sempre em comunidade com seus clérigos, sem possuir nada próprio. Não tinha nada para colocar em testamento. À sua Igreja de Hipona não tinha outra coisa para deixar senão seus livros: tanto os que ele mesmo havia escrito como os que havia adquirido ou recebido de seus amigos. Uma das últimas recomendações foi que conservassem cuidadosamente sua biblioteca para os que viessem depois dele.

Após alguns dias, os amigos que lhe atendiam viram que Agostinho não se curaria. A debilidade do enfermo aumentava. Sua mente continuava lúcida até o último momento e não parou de dirigir as suas recomendações espirituais. Incessantemente orava a Deus. Possídio e os que o acompanhavam respondiam às suas preces.

Fora das muralhas fervia a luta entre defensores e atacantes. No quarto do enfermo tudo era paz e silêncio. O clero de Hipona de joelhos, recitava em silêncio a oração dos agonizantes. Entretanto o doutor da graça e do amor, depois de 76 anos de vida e 40 de incansável luta em favor da Igreja, cai na agonia para ser recebido com júbilo na Cidade Santa de Deus.

No dia 28 de agosto do ano 430, o filho de Patrício e Mônica, Agostinho, bispo de Hipona, dormia na paz do Senhor. Contava com 75 anos, 10 meses e 15 dias...

 

AS RELÍQUIAS DE SANTO AGOSTINHO

Os restos mortais de Santo Agostinho foram depositados na Basílica da Paz, em Hipona, onde o santo havia exercido seu ministério pastoral. Depois de quase 70 anos, ante o perigo de profanação por parte dos invasores, os bispos da África os trasladaram para a ilha da Sardenha, onde permaneceram 223 anos na igreja de São Saturnino de Cagliari. Quando a ilha caiu em poder dos sarracenos, o piedoso rei dos lombardos, Luitprando, os resgatou por 70 mil escudos de outro levando-os consigo, no ano 730, para a cidade de Pavia, Itália, e depositando-os na Igreja de São Pedro “in coelo aureo” (no céu dourado).

Vários papas proibiram a exibição pública de seus restos mortais, pois estavam sendo roubadas partes dos mesmos. Por este motivo se perderam as notícias e a memória do lugar onde estavam. No ano 1695, no entanto, por ocasião de reforma da Igreja, foram descobertos numa caixa de prata com a inscrição: Augustinus. O Papa Bento XIII declarou-os autênticos.

Novos transtornos políticos ocorrem na Itália. Com medo de novas profanações, em 1832, o bispo de Pavia os transferiu para a catedral de mesma cidade. No ano 1900, o padre Tomás Rodrigues, Superior Geral da Ordem Agostiniana, conseguiu que fossem devolvidos à Igreja de São Pedro, propriedade dos Agostinianos, onde repousa atualmente.

A estes sagrados restos faltam: o braço, que foi enviado a Cartago em 1842, a pedido de Monsenhor Dupunch, primeiro bispo de Argel; e o coração, que se conserva em Lion.

Semblanzas de San Agustín, 500.

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