Dos escritos de Agostinho

DEUS É A VIDA DE TUA ALMA

“Tua alma morre perdendo a sua vida. Tua alma é a vida do teu corpo, e Deus é a vida de tua alma. Do mesmo modo que o corpo morre quando perde a sua alma, que é sua vida, assim a alma morre quando perde a Deus, que é sua vida. Certamente, a alma é imortal, e de tal modo é imortal, que vive mesmo estando morta. Aquilo que disse o Apóstolo da viúva que vivia em deleites pode-se dizer também da alma que tem perdido o seu Deus: que vivendo está morta”.

(Com. Ev. de João, 47, 8)

UM ENCONTRO COM A VIDA. ESTA FOI A SUA PÁTRIA

 

O Africano

Santo Agostinho foi filho da África, abundantemente regada com o sangue dos mártires. A sua terra natal foi Tagaste. Na atualidade, é uma pequena vila da Argélia com cerca de dois mil habitantes chamada Souk‑Ahras. Quando Agostinho ali viu pela primeira vez a luz do dia, era uma pequena vila sem importância de maior, cujo número de habitantes não podemos indicar. Pertencia à província da Numídia, uma das muitas em que estava dividido o imenso império romano. Situada numa meseta, a setecentos metros de altitude, o sustento necessário era‑lhe fornecido pelos pequenos vales dos arredores, cobertos de searas e olivais. Entre os seus habitantes e o Mar Mediterrâneo, situado a pouco mais de 300 kms, interpunham‑se grandes pinhais.

Apesar dos cereais e das azeitonas aquela gente conhecia a pobreza. Trabalhava a terra, ganhava com o suor do seu rosto o pão, que iam comer os cidadãos ociosos de Roma ou os soldados que se encontravam junto do Reno ou do Danúbio, defendendo as fronteiras do império, constantemente ameaçadas pelos bárbaros. Os impostos e as taxas oprimiam os pobres camponeses. No entanto, não lhes faltava tempo para assistir, no anfiteatro, aos jogos e caçadas de feras organizadas pelos ricaços das vilas, "os únicos que viviam", à sombra dos quais procuravam proteção. Em troca dela, os senhores apenas pediam uma vênia ou um simples descobrir‑se. Outras vezes conformavam‑se com a glória de ver levantada uma estátua em sua honra no foro da cidade.

O império, que agora lhes comia o pão, havia-lhes dado outro: o da cultura. Ali falava‑se o latim, se bem que muitos camponeses falassem também o púnico ou, talvez só, o púnico, medida que se avançava para o interior isto era o mais freqüente.

O cristianismo tinha já penetrado com firmeza. Poucos anos antes do nascimento de Agostinho, a cidade tinha sido donatista na sua totalidade, mas logo voltou à unidade católica como conseqüência das leis imperiais. A conversão foi algo mais do que oportunista. Agostinho escreveria, mais tarde, que os seus habitantes detestavam tanto o donatismo que dava a impressão de nunca terem estado do seu lado. Mas Cristo ainda não tinha entrado em todos os lares nem em todos os corações, como veremos na família de Agostinho. Agostinho só passou uma parte mínima da sua vida na terra natal. Depressa procurará horizontes mais amplos. O mar, que agora estava longe, far‑lhe‑á companhia durante muitos anos da sua afanosa existência.